Flexibilização - De Trabalhador a Colaborador


Vale a pena rever a situação actual das decisões sobre a flexibilização do mercado de trabalho. De um ponto de vista histórico, estamos de volta à concepção Nacionalista e Corporativista da legislação laboral no segundo terço do século passado. Só na década de 60 e depois de alguma pressão internacional, Portugal começa a sair do marasmo económico que, em muito, essa mesma legislação laboral contribuiu e que viria a ser alterada.

Mas vamos lá ver este pequeno excerto sobre um texto que encontrei de Luís Graça sobre História do Trabalho:


De facto, em 1926 a República é derrubada ou, como lhe chama Nunes (1994, p. 305), "a ‘Nova República Velha’, última fase de um regime demoliberal que, com algumas nuances, continuou a tradição 'liberal oligárquica' característica de um capitalismo pouco desenvolvido". E em 1933 é aprovada a Constituição Política, em vigor até 25 de Abril de 1974.

O Estatuto do Trabalho Nacional, inspirado na Carta del Lavoro do fascismo italiano, vem entretanto consagrar a ideia-força de solidariedade entre a propriedade, o capital e o trabalho. O princípio da solidariedade (art. 11º do Estatuto) articulava-se com a exigência de paz social (art. 5º) e implicava a ideia de colaboração interclassista, um eufemismo para designar a total subordinação do trabalho aos interesses do capital monopolista:

  • "O trabalhador (...) é colaborador nato da empresa (...) e associado aos [ seus] destinos (...) pelo vínculo corporativo" (art. 22º);

  • Em todo o caso, afirmava-se inequivocamente o primado do capital sobre o trabalho: "O direito de conservação ou amortização do capital da empresa e do seu justo rendimento são condicionados pela natureza das coisas, não podendo prevalecer contra ele os interesses ou direitos do trabalho" (art. 16º) (Itálicos nossos).

Como consequência lógica, a greve e o lock-out passam a ser punidos (Decreto-Lei nº. 23 870, de 18 de Maio, diploma que só viria a ser revogado em 1974!).

De certa forma, sinto que as nossas vontades políticas actuais vão no mesmo sentido. São as mesmas desculpas de sempre:

  • Solidariedade - Criar a ilusão de distribuir a crise por todos.
  • A servidão ao capital - Tentando salvar o sistema financeiro. Como também servir de perpétua e principal "desculpa" para a redução dos custo de produção.
  • A afirmação do estatuto de colaborador - É uma questão de semântica, mas acho que "colaborador" tem menos força que "trabalhador" numa base de afirmação e segurança de manutenção laboral. Colaborador=Trabalhador precário (não só, mas também).
  • A noção de uma necessidade de "paz social" - Levar a uma reivindicação sem efeitos práticos por parte dos trabalhadores. Em que a legislação relacionada evoluí no sentido de tirar força a essas mesmas reivindicações. Tudo no sentido de induzir uma sensação de marasmo colectivo no que toca a lutar por mais direitos laborais. Tudo em nome da religiosa "paz social" que mantém em vez de mudar.
O que nos traz até às supostas propostas da direita liberal sobre o tema, tanto do senhor Coelho como do nosso PM, o senhor Sócrates. Estas propostas são o maior ataque aos direitos laborais desde 1975 no nosso país e têm todos os traços fascistas que caracterizaram outros tempos.

Tudo em nome de quê ? Da lei do mínimo denominador comum. Meus caros, é o que dá ter a China mais "competitiva". Sim, competitiva e com baixos custo de produção.

Qual é a solução neste país ? Descer "socialmente" ao nível da China para sermos "competitivos". Isso obviamente significa salários mais baixos, precariedade contratual, aumento da carga de trabalho e tudo aquilo contra o qual foi lutado durante o fascismo. Pergunto: Porque não criar uma taxa de execução social ? Tanta companhia de rating para o sistema capitalista e nenhum tipo de rating social, com imposição de taxas de comercio internacional para países com baixo nível de protecção social e emprego ?

Basta de perguntas pois a resposta é, e há de ser sempre, a globalização e o mercado livre mundial. E livre para quem ?

Estas novas propostas de flexibilização tem um grande objectivo: Criar um maior controlo sobre os custos de produção como meio para aumentar a competitividade e/ou os lucros da empresa. Mas, e quais custos?

Lá vai a carroça à frente do burro ...

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